
A Biblioteca Global de Medicinas Tradicionais da Organização Mundial da Saúde (WHO TMGL, na sigla em inglês) foi apresentada por João Paulo Souza, diretor da BIREME, como parte da programação da Consulta Regional para Priorização de Pesquisa em Medicina Tradicional, Complementar e Integrativa (MTCI), realizada nos dias 11 e 12 de junho, em São Paulo. O evento foi organizado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), por meio dos Departamentos de Sistemas e Serviços de Saúde (HSS) e Determinantes Sociais e Ambientais para a Equidade em Saúde (DHE), e de seu Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME), junto com a Organização Mundial da Saúde (OMS), por meio de seu Centro Global de Medicina Tradicional (GTMC). O objetivo da apresentação foi contextualizar historicamente e apresentar o estágio atual de desenvolvimento da TMGL, de modo a promover um diálogo construtivo e colher comentários e sugestões de aprimoramento dos participantes.
Em sua apresentação, João Paulo Souza contextualizou a origem e os marcos políticos que impulsionaram a criação da TMGL, destacando a crescente valorização dos saberes tradicionais em fóruns internacionais, como as Cúpulas dos BRICS e do G20, ambas realizadas em 2023, na África do Sul e Índia, respectivamente. “A recomendação de fortalecimento das práticas tradicionais seguida de uma contribuição financeira voluntária do governo da Índia à OMS contribuíram para a consolidação do projeto”, situou João Paulo. A iniciativa passou, então, a ser desenvolvida em parceria com a BIREME, aproveitando a expertise acumulada pelo Centro na construção de bibliotecas digitais, com destaque para a BVS MTCI Américas, que aborda a mesma temática.
Atualmente em fase pré-beta, a TMGL vem sendo implementada em etapas até alcançar a versão 1.0, cujo lançamento está previsto para dezembro de 2025, a ser realizado durante a 2ª Cúpula Global de Medicinas Tradicionais da OMS, na Índia. A plataforma contempla um portal global, seis portais regionais e 194 páginas de países, além de uma série de coleções temáticas – como Ayurveda e Parteria Tradicional – e ferramentas especializadas como o “Traditional Index Medicus” (TIM), um índice integrado dos jornais e revistas científicas especializadas em MTCI. Com cerca de 1,7 milhão de documentos já integrados, a TMGL também oferecerá acesso a bases de dados, publicações científicas, repositórios digitais, mapas de evidências (desenvolvidos em colaboração com CABSIN e outros parceiros) e recursos de inteligência artificial voltados a ampliar o acesso de gestores, profissionais de saúde, praticantes de MTCI e a pessoas interessadas em temas relacionados à MTCI.
Um aspecto central da apresentação foi a abordagem metodológica participativa adotada pela equipe do projeto. Souza destacou o uso de ferramentas digitais e dinâmicas interativas para coleta de sugestões durante o evento, permitindo que os participantes contribuíssem diretamente com sua avaliação e observações orientadas ao aprimoramento da biblioteca. “Essa estratégia reafirma a visão da TMGL como uma plataforma viva, construída com base no diálogo com especialistas e usuários, e orientada por um compromisso de longo prazo, inspirado na trajetória de 27 anos da BVS”, afirmou o diretor. A imagem abaixo registra alguns dos participantes durante as atividades.
Com base nos aportes dos participantes, Mirelys Puerta Díaz, gestora do produto e ponto focal na BIREME para o desenvolvimento da TMGL, sintetizou as principais sugestões aportadas pelas discussões em grupo:
- Inclusão e acessibilidade: ampliar os recursos de tradução e oferecer formatos acessíveis e materiais audiovisuais, com interfaces adaptadas culturalmente para públicos diversos, incluindo povos indígenas e usuários com deficiência.
- Transparência e organização do conteúdo: estabelecer critérios claros de curadoria, categorização por sistemas médicos e autoria, e implementar filtros de busca avançada por tema, país e tipo de documento.
- Governança e participação social: criar comitês editoriais representativos, mecanismos participativos de consulta e validação de conteúdo com stakeholders locais, além de espaços para construção colaborativa do conhecimento.
- Valorização de saberes locais: promover a documentação de boas práticas, histórias de vida e experiências comunitárias em saúde tradicional, com ênfase na aplicação prática e impacto nas políticas públicas.
- Sustentabilidade e Melhoria Técnica: aprimorar a experiência de navegação, garantir atualizações periódicas e desenvolver estratégias de financiamento e capacitação digital, especialmente voltadas a contextos de difícil acesso.
Díaz acrescenta que componentes de transparência já estão sendo incorporados no atual estágio de desenvolvimento do produto, por meio da abordagem ágil do framework Scrum, o que tem permitido entregas incrementais com foco contínuo em valor e centradas no interesse e experiência do usuário. “Com a adoção dessa metodologia de gestão, temos viabilizado respostas ágeis às necessidades emergentes, garantindo que a TMGL evolua de forma estruturada, com base em escuta ativa e co-criação com os usuários, especialistas em MTCI e stakeholders”, explicou Mirelys.
A Consulta Regional para Priorização de Pesquisa em MTCI nas Américas foi realizada no âmbito de uma iniciativa mais ampla da OMS, voltada a fortalecer práticas baseadas em evidências nas diversas regiões do mundo. O objetivo é promover uma integração mais efetiva dessas práticas aos sistemas de saúde, ancorando-as no diálogo intercultural. Nesse contexto, a TMGL se destaca como um dos principais pilares da estratégia, ao oferecer um ambiente digital robusto, inclusivo e sensível à pluralidade de saberes e às diferentes políticas relacionadas à saúde tradicional globalmente.